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terça-feira, 14 de setembro de 2010

ODILON NUNES DE SÁ

 A PATATIVA DAS ESPINHARAS


José Ozildo dos Santos

               Poeta talentoso, Odilon Nunes de Sá foi uma das maiores expressões da poesia popular no Sertão das Espinharas. Nasceu a 8 de dezembro de 1900, no sítio Riacho do Cipó, zona rural do antigo município de Patos, hoje, parte integrante do território de Santa Terezinha, Estado da Paraíba. Foram seus pais Celso Nunes de Sá e Maria Nunes do Espírito Santo. Órfão de pai, aos 13 anos de idade, juntamente com seus cinco irmãos menores, teve que trabalhar para garantir o sustento de sua família.
               Menino pobre, não teve muito acesso à escola. O próprio poeta, em notas autobiográficas, afirma: “como criança de poucas condições financeiras, tive que me contentar com o quarto ano primário, cujo grau escolar representava uma grande conquista”.

               Sua juventude foi toda vivida no meio rural, trabalhando na agricultura e enfrentando as dificuldades da vida. Contudo, ainda encontrou tempo para aprender a tocar ‘concertina de oito baixos’, tornando-se exímio tocador. Com sua arte, alegrava as noites de seu sertão e ganhava alguns trocados.
               Era, em sua mocidade, o maior tocador da região das Espinharas. No entanto, a poesia estava em seu sangue, em suas veias. E, “com o passar dos tempos - dizia o próprio Odilon - senti que era mais fanático pela poesia, dom divino que descobrira desde a infância”. Em 1936, aos 35 anos de idade, Odilon Nunes de Sá passou a exercer as profissões de tocador e cantador, atuando com freqüência nas feiras do Sertão das Espinharas. E, logo “entendeu que era mais fanático por poesia”.
               Em princípios do ano seguinte, levado pelas dificuldades da vida, transferiu-se para o interior da Bahia, na companhia de sua genitora. Por dois anos, viveu pelos sertões baianos, cantado e tocando para ganhar o ‘pão de cada dia’. Foi por esse tempo que firmou-se como cantador, tendo topado um desafio com o famoso Manoel Campina, à época, o melhor cantador daquele Estado nordestino.
               Em 1939, Odilon Nunes de Sá estava de volta ao Sertão das Espinharas. Nesse mesmo ano, aos 9 de novembro, contraiu núpcias com a senhora Maria Camboim Nunes de Sá, que foi sua companheira até o final de sua fecunda e produtiva existência. Casado, deixou de lado a ‘concertina’, dividindo seu tempo com as atividades agrícolas e a poesia. Em busca do sucesso, apresentou-se em várias capitais brasileiras, a exemplo de João Pessoa, Natal, Curitiba, Fortaleza, Belém, Salvador e São Paulo, onde participou de diversos congressos de violeiros e festivais de poesia popular.
               Em 1954, apresentou-se num festival junino, realizado na sede social do ‘Náutico Esporte Clube’, no Recife, oportunidade em foi aplaudido de pé, por todos os presentes, ao declamar belas composições de sua lavra. Sintonizado com tudo que dizia respeito à poesia popular, esteve presente também de vários eventos festivos, na Paraíba, tendo ainda feito programas nas Rádios Tabajara (João Pessoa), Borborema (Campina Grande) e Espinharas, de Patos.

               Em suas constantes andanças pelo Brasil, retornou à Bahia em meados de 1960, oportunidade em cantou em várias cidades daquele Estado. Desse período, é o poema ‘O Poeta na Saudade’, no qual lembra seu sertão, seu lar, recordando “o juazeiro / perto da casa a distância / aonde na minha infância / gozei um doce carinho” (...). Apegado à sua terra, dizia em seus versos:

               “Sou caboclo da aldeia
               Do sopé da cordilheira
               Aonde estão os ressonos
               De Romano do Teixeira
               E onde estão os cochilos
               De Inácio da Catingueira”.

Odilon contando na feira livre de Patos-PB

               Figura ímpar, ingressando na política, elegeu-se vereador à Câmara Municipal de Santa Terezinha, dando significativa contribuição àquela cidade, que viu nascer e que contribuiu para seu progresso. Militante de reconhecido valor, foi-lhe outorgado o ‘Diploma de Honra ao Mérito’ (in memoriam), pelo Diretório Estadual do PMDB - agremiação política à qual pertencia - em maio de 2000. A mais completa prova do prestígio gozado por ‘seu’ Odilon junto à população de Santa Terezinha, foi a escolha do nome de sua esposa para concorrer ao cargo de Vice-prefeito, na chapa encabeçada pelo médico José Gayoso Filho, ambos eleitos para o período de 1997-2001.
               Em dezembro de 1987, ‘seu’ Odilon encontrava-se numa festa de aniversário de uma filha de sua sobrinha Iolanda, “fazendo e respondendo a todos com versos e improvisos”, quando recebeu de David Camboim (também seu sobrinho), o seguinte mote: ‘Odilon é o garoto / Que comanda o século vinte”.
E, rapidamente gozou:

               “Tenho oitenta e sete anos,
               Nasci em mil e novecentos
               E ainda faço meus inventos
               Pela idéia e os planos,
               Os prodígios soberanos
               Nunca me fazem acinte,
               No tempo constituinte
               Ainda dou carreira e chôto,
               Odilon é o garoto
               Que comanda o século vinte”.

               Odilon Nunes de Sá faleceu aos 16 de maio de 1997, na cidade de Patos, onde residia desde 1980. De seu casamento com dona Maria Camboim, nasceram onze filhos: Natividade, Luís, Conceição, Celso, Moisés, Raimundo, Socorro, Fátima, Terezinha, Arimatéia e Geraldo. Este último, falecido ainda criança.
               Com a morte de Odilon Nunes de Sá, “a Paraíba perdeu / um ídolo da poesia”, conforme afirmou em versos o poeta Edísio Soares Pequeno, bisneto do famoso Romano de Mãe-D’Água:

               “Aos dezesseis do corrente
               Mês de maio deste ano
               De Odilon acaba o plano
               No mundo que foi vivente
               A morte ingrata serpente
               Mata de noite e de dia
               É a sua filosofia
               Pois Jesus também morreu
               A Paraíba perdeu
               Um ídolo da Poesia

               Uma viola encostada
               Sem dela se ouvir o som
               Pertencente a Odilon
               Com quem fazia noitada
               Em sua casa guardada
               Esse símbolo de simpatia
               Que tanto Odilon queria
               E junto a ela morreu
               A Paraíba perdeu
               Um ídolo da Poesia.

               Entre muitos trovadores
               Seu Odilon foi julgado
               Não cantava pé quebrado
               Nem temia julgadores
               Deu prova aos cantadores
               Do dom que nele existia
               Foi escritor de valia
               Dos livros que escreveu
               A Paraíba perdeu
               Um ídolo da poesia”.

               Poeta popular de grande talento e projeção, ‘seu’ Odilon possuía uma inspiração fecunda, rimando no improviso, os mais variados temas. Possuidor de uma memória invejável, como poucos, fazia seus versos no repente, “conseguindo gravá-los na memória e repeti-los quantas vezes se fizessem necessário, sem mudar uma só letra, seja no estilo trocadilho, trava-língua, decassílabo, etc”. Esse bom divino, preservou-o até o final de sua produtiva existência.
               Como poeta, Odilon Nunes de Sá era impecável no seu linguajar. Seus versos, revestidos por uma atualidade constante, mantêm-se sempre atuais, podendo ser recitados em qualquer época. Com sua poesia, rica em conteúdo e valor, ‘seu’ Odilon - como era popularmente conhecido - mostra “que o poeta repentista pode ser, além de poeta: ator, catedrático, religioso, cientista, profeta, professor, enfim, um homem entendido de tudo, sem freqüentar escolas ou faculdades”.
               Considerado em vida, o mais velho poeta brasileiro em atividade, sua poesia possui mensagem e musicalidade, revelando o poeta por inteiro e mostrando o sertanejo enamorado de sua gleba. Sua produção poética é extensa e valiosa. Em vida, além de inúmeros folhetos de cordel, publicou os seguintes livros: ‘Detalhes de um poeta’; ‘Vida, destino e sorte’ e ‘O silêncio e a poesia’.
               Em 1999, quando da realização do ‘Grande Encontro de Poetas e Repentistas’, realizado em João Pessoa, no período de 30 de abril a 1º de maio, Odilon Nunes de Sá foi um dos nomes reverenciados. Grande parte de sua produção poética foi inserida nos Anais daquele referido evento, que teve como coordenador o poeta José de Sousa Dantas.
               Como homem, ‘seu’ Odilon tinha seus defeitos. Mas estes eram superados por suas inúmeras qualidades. Sentimentalista, possuía um coração generoso e uma alma por demais caritativa. Moralista, nunca utilizou-se de sua arte poética para ferir ou retaliar pessoas. Pois, era um homem que não alimentava o ódio. Como poucos, fazia da vida uma quadra especial, sempre buscando conquistar a amizade e a admiração de muitos. Cumpriu, pois, uma sentença do bem viver e deixou para seus inúmeros descendentes, uma das mais belas lições e exemplos de vida.
               Odilon Nunes de Sá era poeta pelo senso e pela intuição. Suas estrofes, construídas com métrica e zelo, fazem dele um poeta por inteiro, respeitado, lido e recitado. Pois, seu rimar franco era único e é por isso que o autor de ‘Detalhe de um poeta’ caminha para a imortalidade, sentando ao lado de expoentes como Ungolino, Leandro Gomes de Barros, Romano do Teixeira, Inácio da Catingueira, Zé da Luz, Lourival e Octacílio Batista, Cego Aderaldo, entre outros grande luminares da poesia popular brasileira.


Lançamento do livro de Odilon, em Patos

               Em 1995, o escritor e advogado cearense Solano Mota Alexandrino, reuniu num precioso volume, sob o título ‘Grandes Momentos de Odilon Nunes de Sá’, alguns poemas desse talentoso vate das Espinharas. O referido livro - que “se constitui num resumo de todos os outros livros e folhetos escritos por Odilon” - foi lançado numa noite de autógrafos, realizada no ‘Patos Tênis Club’, bastante prestigiada e constitui-se numa antologia preciosa.
               Ainda pelos esforços do amigo e admirador Solano Mota, esse imortal vate das Espinharas foi homenageado pelo Governo do Estado do Ceará, em solenidade realizada em Fortaleza, no dia 29 de julho de 1995, que contou com a participação de autoridades, políticos e inte¬lectuais cearenses. À época, “consi¬derado a última reserva de sua geração de poetas”, Odilon Nunes de Sá, em vida, teve em terra alheia, o reconhecimento do valor de seu trabalho artístico-cultural.
               Para Jomaci Dantas, “em cada poema, o poeta Odilon”, expressava “a beleza da vida e os dissabores existentes na mesma, e assim” seguia “despontando auroras e realizando desejos de sua própria alma”. Pois, suas poesias nasciam “das águas dos rios, do cantar dos passarinhos, do encontro das rosas, da pureza dos lábios infantis, coisas sublimes que sempre são sentidas pelos homens de sentimento poético”.
               Homem simples e temente a Deus, Odilon Nunes de Sá versejava:

               “Todo aquele que vive mal ou bem
               Sempre quer que a vida viva mais,
               Prá ter vida e viver vivendo em paz
               Com outros tantos dos anos que já tem,
               Nunca quer esperar se a morte vem
               E quando vem, ai sim não quer saber,
               Só deseja a vida ainda crescer
               Na crescença de uma idade ainda crescida,
               Agradeço a vida ainda ser vida
               E eu ter vida vivendo prá viver”.

               De uma feita, estava ele, cantando na companhia do poeta José Soares Sobrinho, quando este, aludindo o fato de ser moço, disse: “Não devia mais viver/ Um velho da sua idade”. Com sua imaginação fértil, ‘seu’ Odilon retrucou:

               “Acho graça a mocidade
               Não querer envelhecer
               Velho ninguém quer ficar
               Moço ninguém quer morrer
               Sem ser velho ninguém vive
               Bom é ser velho e viver”.

               Noutra ocasião, enfrentando o famoso repentista pernambucano Jô Patriota, ouviu deste:

               “Você hoje vai saber
               o que é cantar com Jó,
               eu vim aqui prá tirar
               sua fama em Piancó,
               daqui vou tirar o resto
               no Riacho do Cipó”.

               Imediatamente, Odilon retrucou:

               “No Riacho do Cipó
               não escorrego e nem tombo,
               você não vá que apanha
               que a pele vira calombo,
               o riacho fica pra mim
               e o cipó é pra teu lombo”.

               Autoridade no versejar, Odilon Nunes de Sá era o exemplo perfeito do poeta popular verdadeiro, original, imaginoso, espontâneo e inesgotável, que, onde se apresentava, recebia os aplausos unânimes das platéias. Nele, “a naturalidade e a presteza das improvisações, sob qualquer aspecto, quer se tratando de um tema de salão ou de um mote de fim de rua, evidenciava o fortalecimento de uma inteligência a serviço de uma fabulosa tendência poética”.
               Em seus versos, esse talentoso poeta das Espinharas, imprimia sentimentos grosados num sentido filosófico próprio de quem sabe sentir e pensar. Para ele, “O homem quando é poeta / Só faz o verso medido / Nunca faz curto demais / Nem também muito comprido”, pois, “Sendo de menos não presta / Sendo de mais é perdido”.
               Dotado de uma inteligência fértil, a grandeza de sua obra poética permanece de forma intacta, aguardando algum estudioso que valorize o que é produzido nas Espinharas. Apaixonado cultor da rima, as últimas produções de sua lavra foram reunidas num livro (que em breve será publicado por seus familiares), sob o título ‘A Pátria, o Livro e a Espada’, no qual “registra algo da história nacional e revela a verdadeira importância do livro para a humanidade”.

2 comentários:

  1. Parabéns pelo Blog muito bom e espero que você dê uma olhadinha no meu...

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  2. Meu caro amigo José Ozildo,
    O Deus que está em mim saúda o Deus que está com você.
    Um amigo seu me enviou o seguinte comentário.

    Estimada Edna,bom dia,encontrei seu email no blog do historiador Jose Ozildo dos Santos,um velho amigo com quem perdi o contato há alguns anos,no entanto, ele nao coloca seu email particular nem o telefone, gostaria de saber se voce pode me ajudar? Quero fazer uma surpreza a ele. Nao se assuste sou Claudionor Barroso Barbalho Prof. aposentado do Departamento de Historia da UFRN e atualmente Segundo Secretario do Instituto Historico e Geografico do RN,e Presidente do Conselho Fiscal da Uniao Brasileira de Escritores Secçao RN, meus telefones: 3218 1926 residencial - 9111 8585 cel.,pode ligar a cobrar, ou mandar por email os dados do meu amigo Ozildo,ficarei muito agradecido e a sua disposiçao nas instituiçoes a que pertenço, peço desculpas pelo formato desta redaçao,é que sou semi-analfabeto em compaçao,nao consegui preencher o cadastro da Unyc comandada pelo meu ausente amigo.

    Claudionor Barroso Barbalho

    Me mande dizer alguma coisa para o meu e-mail
    ednaraujo@gmail.com
    9921-9701

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