A TRAJETÓRIA DE UMA VIDA
José Ozildo dos Santos
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História da Humanidade é traçada pelas biografias de seus grandes homens. Celeiro da cultura paraibana, Patos também já produziu nomes com grandes projeções nos cenários políticos e sociais do Estado. E, impossível é falar nesta cidade sertaneja sem citar o nome de Ernani Sátiro, um dos mais ilustres de seus filhos, que, com coerência, determinação e inteligência, soube imprimir seu nome na Historia da Paraíba.
Patoense, dotado de uma vivacidade de espírito fora do comum, Ernani Aires Sátiro e Sousa nasceu a 11 de setembro de 1911, sendo filho do casal Miguel Sátiro e Sousa e Capitulina Aires Sátiro e Sousa. Seu pai, figura de larga influência, manteve-se na chefia política do município de Patos, durante as três primeiras décadas do século XX, elegendo-se deputado estadual por três legislaturas.
Em Patos, Ernani Sátiro fez seu curso primário, tendo como professores, entre outros, Alfredo Cabral, Rafael Correia de Oliveira e Renato de Alencar. Em 1924, transferiu-se para a capital paraibana, matriculando-se no Colégio Diocesano Pio X. Três anos mais tarde, ingressou no tradicional Lyceu Paraibano, onde concluiu o antigo curso de preparatórios.
Em 1930, matriculou-se na Faculdade de Direito do Recife. Neste mesmo ano, publicou seu primeiro artigo, no jornal paraibano “A União”, tendo iniciado no jornalismo profissional, como redator do “Diário Pernambucano”.
Naquela Faculdade, logo cedo engajou-se no movimento estudantil, vindo a ocupar a presidência do Diretório Acadêmico em 1933, ano em que diplomou-se em Ciências Jurídicas e Sociais, tendo como companheiros de turma, entre outros, José Mário Porto, Apolônio Nóbrega, Adalberto Ribeiro, João Santos Coelho, Ascendino Moura e Aurélio de Albuquerque, nomes de projeção e destaque na vida social e política paraibana.
Ainda no Recife, manteve suas primeiras relações com os escritores Gilberto Freire, Olívio Montenegro e Odilon Nestor, com os quais, manteve fortes laços de amizades, conservados por longos anos.
Ernani, o advogado (1933)
Volvendo à Paraíba, instalou-se com banca de advogado na cidade de Patos e não desmentindo às tradições de sua família, ingressou na política, elegendo-se deputado à Assembléia Estadual Constituinte, nas eleições realizadas a 14 de outubro de 1934, pelo Partido Libertador.
No ano seguinte, contraiu núpcias com a senhora Antonieta Agra Cavalcanti, de importante família da sociedade campinense. Desta união, nasceram três filhos: Bertoldo Sátiro e Sousa, Sileide Sátiro de Sá Ribeiro e Gleide Sátiro Sales, todos bacharéis em Direito.
Com a dissolução da Assembléia Legislativa, após o Golpe do Estado Novo (10-11-1937), Ernani Sátiro teve seu mandado parlamentar prejudicado. E, fixando residência em Campina Grande , passou a dedicar-se à advocacia, atuando também na capital do Estado e em Patos.
Em 1939, a convite de Argemiro de Figueiredo - que, à época governava a Paraíba, na condição de Interventor Federal - assumiu o cargo de Chefe de Polícia, em cujas funções permaneceu até 9 de julho de 1940, quando foi nomeado Prefeito do município de João Pessoa.
Sua passagem pela Prefeitura da capital, foi meteórica. Dezenove dias após haver tomado posse, veio a queda de Argemiro de Figueiredo, conseqüentemente, determinado seu afastamento do referido cargo.
De 1940 a 1945, Ernani Sátiro fez exclusivamente advocacia em Campina Grande. Nesta época, iniciou-se na literatura, “chegando a escrever uma novela, intitulada ‘Rosa dos Ventos’, que daria origem, posteriormente, ao romance ‘O Quadro Negro”.
Em princípios de 1943, publicou seu primeiro trabalho jurídico, sob o título ‘O Novo Conceito de Legítima Defesa’. Dois anos depois, com a redemocratização do país, ingressou na União Democrática Nacional - UDN, de cuja legenda foi um de seus fundadores na Paraíba, elegendo-se deputado à Assembléia Nacional Constituinte, após obter 6.759 votos.
Durante os trabalhos constituintes, “dedicou-se à defesa dos ideais municipalistas e discutiu, repetidas vezes, o problema da exploração do subsolo”. Na Câmara dos Deputados, logo firmou-se como parlamentar atuante, integrando o bloco da oposição e na condição de vice-líder de sua bancada, projetou-se nacionalmente. Reeleito para sucessivas legislaturas, na Câmara dos Deputados, pertenceu as Comissões de Legislação Social, Justiça, Orçamento e do Polígono das Secas, além de ter participado de várias comissões especiais.
Em 1950, iniciou uma intensa atividade literária, escrevendo numerosos ensaios, que foram publicados em suplementos literários dos jornais O Jornal de Letras, Tribuna da Imprensa, Diário Carioca e Diário de Noticias, no Rio de Janeiro. Quatro anos mais tarde, quando conseguiu seu terceiro mandato federal, publicou seu primeiro livro: “O Quadro Negro” - que foi bem recebido pela crítica literária - seguido depois por “Mariana”, que saiu do prelo em 1958.
Em 1960, seguindo a orientação da UDN, Ernani Sátiro engajou-se na campanha que levou Jânio Quadros à Presidência da República. No ano seguinte, elegeu-se Secretário-Geral de seu partido, em âmbito nacional, adotando após a renuncia de Jânio, uma postura oposicionista em relação ao Governo João Goulart.
Em 1960, seguindo a orientação da UDN, Ernani Sátiro engajou-se na campanha que levou Jânio Quadros à Presidência da República. No ano seguinte, elegeu-se Secretário-Geral de seu partido, em âmbito nacional, adotando após a renuncia de Jânio, uma postura oposicionista em relação ao Governo João Goulart.
Após a Revolução de 1964, foi eleito Presidente do Bloco Parlamentar Revolucionário, “criado com o objetivo de dar sustentação parlamentar ao Governo Castelo Branco”. Eleito Presidente Nacional da UDN (1965), ocupou o referido cargo até a instituição do bipartidarismo.
Em 1968, foi nomeado Ministro do Superior Tribunal Militar. Dois anos mais tarde, já aposentado do STM, foi eleito Governador do Estado da Paraíba, por via indireta, a 3 de outubro de 1970, para o quatriênio de 1971-1975, tendo como Vice, o Dr. Clóvis Bezerra Cavalcanti, ambos filiados à ARENA, partido que representava o situacionismo. Diplomado a 24 de novembro daquele mesmo ano, tomou posse no Governo da Paraíba, perante a Assembléia Legislativa, em solenidade realizada a 15 de março de 1971.
Seu governo foi considerado operoso e probo, destacando-se entre suas realizações, as seguintes obras: Centro Administrativo de Jaguaribe; Edifício da Assembléia Legislativa; Estádio de Futebol de João Pessoa; Estádio de Futebol de Campina Grande; conclusão do Hotel Tambaú; I Adutora de Campina Grande; Mercado de Artesanato (João Pessoa); Edifício de ‘A União’, no Distrito Industrial de João Pessoa; o Fórum Municipal ‘Miguel Sátiro e Sousa’, na cidade de Patos; além da construção de várias Escolas Polivalentes e Colégios Estaduais, nas cidades de João Pessoa, Campina Grande, Sousa, Cuité, Pombal, Cabedelo, Guarabira, Alagoa Nova e Cajazeiras.
Ernani Sátiro, o governador
Como Governador, permaneceu no exercício de suas funções administrativas até o final de seu mandado e a 15 de março de 1975, transferiu o referido cargo ao seu sucessor, o Dr. Ivan Bichara Sobreira.
Em 1978, reelegeu-se para seu sétimo mandato como Deputado Federal, após obter 28.959 votos. Quatro anos mais tarde, foi reconduzido à Câmara dos Deputados, com a expressiva votação de 51.435 sufrágios. Este, foi, portanto, seu último mandato parlamentar. Faleceu na madrugada do dia 8 de maio de 1986, em Brasília, no pleno exercício de suas atividades parlamentares.
Consciente do dever cumprido, Ernani Sátiro em entrevista concedida ao jornal ‘A União’, publicada sob o título ‘Ernani Admite Abandonar a Política em 1986’ , prevendo seu futuro, afirmou: “estou inclinado a não mais me candidatar. No final do meu mandato, eu vou completar 76 anos e acho que não terei mais condições de desempenhar bem a minha função. Agora, ajudarei meus amigos, os candidatos a deputados estaduais e outros cargos. Não os abandonarei, embora a minha tendência seja não disputar mais nenhum cargo”.
Dono de um currículo político invejável, durante mais de cinqüenta anos de vida pública, Ernani Sátiro foi quase tudo: Deputado Constituinte (estadual e nacional), Deputado Estadual e Federal, Prefeito da Capital paraibana, Ministro do Superior Tribunal Militar e Governador.
Homem de letras e escritor talentoso, viveu dividido entre a política e a literatura. Pertenceu à Academia Paraibana de Letras, à Academia Brasiliense de Letras, ao Instituto Histórico e Geográfico Paraibano e à Academia de Letras de Campina Grande. Criado o Instituto Histórico e Geográfico de Patos, foi escolhido patrono da cadeira nº 3, atualmente ocupada pelo pesquisador Amaury Sátiro Fernandes.
Como leitor, tinha preferência pelas obras de Stendhal, Faulkner, Dostoievski, Proust, Thomas Mann e Wassermann, entre autores os estrangeiros, e, de Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Raul Pompéia, Augusto dos Anjos, Carlos Drummond e Manoel Bandeira, entre os nacionais.
Fisicamente, Ernani Sátiro era baixo e forte. Possuía uma voz grave e sonora. Conversando, “dava sempre a impressão de que se encontrava na tribuna da Câmara ou no palanque de um comício” e de modo interessante, conseguia combinar o pitoresco do linguajar nordestino com a mais erudita de todas as prosas. Homem simples, gostava “das coisas certas nos lugares certos” e “era capaz de interromper uma importante conserva política para tomar parte num bate-papo literário”.
Ernani, o jurista
Patoense dos mais ilustres, seus restos mortais, a 8 de maio de 1993, foram transladados para sua cidade natal e depositados num mausoléu construído na Fundação da qual é patrono, instituída pelo Governo do Estado, através da Lei nº 5.048, de 21 de junho de 1988, visando dinamizar a cultura no sertão paraibano.
Em 1992, a referida fundação, iniciou a publicação de suas ‘Obras Completas”, composta por romances, poesias, ensaios, discursos, conferência e pareceres, prevendo a publicação inicial de 38 volumes, projeto este, que encontra-se em pleno desenvolvimento.
Eis a trajetória da vida de Ernani Aires Sátiro e Sousa, um homem, cujo perfil biográfico enriquece a Historia da Paraíba em todos os sentidos e enobrece a cidade de Patos, projetando-a nacionalmente.
Publicado no Jornal A Voz do Povo, Patos-PB, Ano VI, nº 77, julho de 2003.
Professor José Ozildo como historiador gostaria de saber o que poderia informar sobre a Lei de Anistia os acontecimentos contemporâneos da época, os bastidores. Lei essa que foi de Relatória do meu saudoso avô Ernani Satyro
ResponderExcluirGostaria de ver o discurso feito pelo governador em exercício Ernani Sátyro por ocasião da inauguração do Hospital Distrital de pombal em 1973
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