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sábado, 4 de janeiro de 2025

NOSSAS PRODUÇÕES ACADÊMICAS - 16

 

LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS EM DEBATE

 

APRESENTAÇÃO

José Ozildo dos Santos

Professor Universitário 

Não é preciso uma pesquisa muito aprofundada para se constatar que os surdos, ao longo da História, não tiveram seus direitos garantidos. Na realidade, por muito tempo, foram estereotipados e em muitas sociedades, considerados como sendo débeis mentais ou retardados.

Existem registros históricos que revelam que em várias civilizações antigas, os surdos eram considerados ‘não-humanos’ e vistos como verdadeiros castigos dos deuses. E, por essa razão, deveriam ser mortos ou deixados à própria sorte. Concepções como estas alimentaram por muito tempo o entendimento de muitos povos, fazendo com os surdos vivessem à margem da sociedade.

Somente após o Código de Justiniano [século VI] foi que os surdos passaram a terem alguns direitos, desde que fossem capazes de se comunicarem. E, para conquistarem tais direitos, os surdos oriundos das famílias ricas passaram a ser educados através da sinalização. Assim, pode-se afirmar que as primeiras ações de ensino, voltadas para os surdos, foram motivadas por razões econômicas.

Foi ainda na antiga Roma que surgiram as primeiras iniciativas voltadas para a educação dos surdos. E esta, passou a ser discutida e construída ao longo dos séculos. A História também registra nomes como John of Beverly, Bartolo della Marca d’Ancona, Girolamo Cardano, Rudolf Agrícola, Pedro Ponce de León, Manuel Ramírez de Carrión, Juan Martin de Pablo Bonet, John Wallis, Jacob Rodrigues Péreiere, Johann Conrad Amann, Fray de Melchor Yebra, Charles Michel L’Épée, Jean Massieu, Ferdinand Berthier, Laurent Clerc, Thomas Braidwood, Samuel Heinicke, Tiburcio Hérnandez e Eduard Huet, dentre outros, por suas excelentes e significativas contribuições à promoção da educação dos surdos, desenvolvendo diferentes métodos e práticas de ensino direcionadas a esse público especial.

Convém ressaltar que Eduard Huet é o precursor da educação de surdos no Brasil. A ele se deve a criação da primeira escola para surdos no Rio de Janeiro - iniciativa que foi abraçada por D. Pedro II - como também a estruturação da Língua de Sinais de Brasileira, espelhada nos moldes definidos por Charles Michel L’Épée e aplicados no Colégio de Surdos, de Paris.

Quando se fala em língua de sinais a ideia errônea que se tem é de trata-se de algo recente. No mundo científico, uma das mais antigas referências às línguas de sinais data do século IV a.C. Sócrates, filósofo grego, que viveu entre 470-399 a.C., foi o primeiro estudioso a promover uma reflexão sobre a língua de sinais, argumentando -, segundo Platão em seu diálogo ‘Crátilo’ -, que “se não tivéssemos voz nem língua, mas apesar disso desejássemos manifestar coisas uns para os outros não deveríamos, como as pessoas que são mudas, nos empenhar em indicar o significado pelas mãos, cabeça e outras partes do corpo?”

Acolhendo as palavras de Sócrates, pode-se dizer que a língua dos sinais há muito tempo faz parte da vida do surdo. Na realidade, é parte dele e negar essa língua - bem como sua importância -, é negar a cidadania da pessoa surda.

Assim, reconhecer a língua de sinais como sendo a primeira língua do surdo, independentemente de sua nacionalidade, é abrir as portas da sociedade à comunidade surda, incluindo-a de forma completa. É reconhecer que o surdo tem voz. E, enquanto ser humano, é sujeito titular de todos os direitos ditos ‘direitos humanos’.

A língua de sinais facilita a inclusão social da pessoa surda, fazendo com esta se comunique melhor, interaja com o público ouvinte, aprenda e amplie seus conhecimentos dentro e fora da sala de aula.

Desta forma, reconhecendo a língua de sinais como sendo um verdadeiro instrumento facilitador da comunicação entre os surdos e, entre estes e as pessoas ouvintes, o Estado brasileiro sancionou a Lei nº 10.463/2002, reconhecendo a Língua Brasileira de Sinais - Libras como sendo um meio legal de comunicação e de expressão. E, ao mesmo tempo, definindo-a como a primeira língua da comunidade surda brasileira.

Entretanto, apesar da citada lei encontrar-se em vigor há mais de vinte anos, ainda hoje é preciso assegurar que a Libras seja a primeira língua do surdo em nosso país, reconhecendo que este é um ser bilíngue e que o português é a sua segunda língua. Existe também a necessidade de se transformar a escola em palco e cenário de promoção e de valorização dos direitos do surdo.

Deve-se reconhecer também que a escola tem a missão de mostrar [lê-se ‘ensinar’] a sociedade como incluir a pessoa surda, eliminando de seu seio tudo aquilo possa representar ou incentivar o preconceito e a exclusão.

Entende-se que a maneira mais fácil de se fazer tudo isto é promovendo uma completa inserção da Libras no ambiente escolar. Não preferencialmente na educação superior. Mas, na educação básica, dando - ou melhor, garantindo - a criança surda a oportunidade de melhor se comunicar com seus pares, aprender e compartilhar seus conhecimentos.

Essa inserção não pode ser definida como algo precoce, mas como algo extremamente necessário. No dia em que a escola for capaz de proporcionar isto, reconhecidamente será um espaço para todos. E nela, a criança surda estará no mesmo patamar ocupado pela criança ouvinte, dialogando, construindo o seu próprio aprendizado, capacitando-se para a vida e para o exercício pleno da cidadania.

O presente livro, produzido por professores, interpretes de Libras e alunos surdos, mostra um pouco do longo e difícil processo enfrentado pela comunidade surda, na luta por seus direitos, dentre os quais se inclui o reconhecimento da Língua Brasileira de Sinais como sua primeira língua e como a melhor estratégia de comunicação para os indivíduos surdos.

 

Link para acesso ao nosso e-book

https://archive.org/details/li-ngua-brasileira-de-sinais-em-debate 

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